Tuesday, April 3, 2007

POSTA TURVA

POST
3 Abril 2007
O Típico Cenário de Interrogatório. Cine-Tuga de gabardina e óculos escuros regressa à sua função.

CINE-TUGA: (apontando um a lanterna) Então como está o processo de finalização do filme? Atrasado? ( sorriso desdentado)

Edgar Pêra (acagaçado) Bem…Atrasado atrasado, da nossa parte não. O melhor é falar com a produção…

CINE-TUGA: Estás a ser oclusivo.

Edgar Pêra (disfarçando) Quero dizer, o filme ainda não está com a qualidade final com que foi filmado. O Luís Branquinho (director de fotografia) ainda vai ter de fazer a supervisão da correcção de côr.

CINE-TUGA: Cor já não tem acento circunflexo.

Edgar Pêra: São arkaísmos de que não abdico.

CINE-TUGA: Não abdicas?

Quando ouvimos “Luís Branquinho” uma luz turva inunda o cenário. Os dois intervenientes são possuídos neste preciso momento pelo espírito do seu avô, Branquinho da Fonseca…

CINE-TUGA: Não abdicas? “Porque é que se recusa a seguir o caminho dos outros?”

Edgar Pêra: “Porque no caminho dos outros um homem está parado”

CINE-TUGA: “E um homem parado não serve para nada….”

Regressam às suas banalíssimas consciências, o interrogatório prossegue no cenário alagado pela luz amarelada.

CINE-TUGA: De que é que estávamos a falar?

Edgar Pêra (aproveitanto a desatenção) Das referências obscuras.

CINE-TUGA (perplexo): Quais?

Edgar Pêra: Durante a cena do pagamento por exemplo. Chamam para receber um tal António Madeira. E José Régio.

CINE-TUGA (ainda atónito) Madeira? É alguma referência ecológica?
À destruição da mata, à betonização do planeta?…Régio? referência à monarquia?

Edgar Pêra (bibliográfico): António Madeira, pseudónimo utilizado inicialmente por Branquinho da Fonseca. José Régio, co-fundador da revista Presença, fundamental na….

CINE-TUGA (apercebendo-se da manha): Deixa estar que eu faço um link. Podes dizer-me então em que fase se encontra Rio Turvo?

Edgar Pêra: Queres porrada é ? olha que há uma cena de violência no filme da qual te posso falar. O Sérgio Grilo faz de Sargento Bera. Não fui que inventei o nome já vem no conto, embora no conto o Sargento Bera não tem uma personalidade irrascível como o do filme….mas gostei muito da sonoridade do nome.

CINE-TUGA (engolindo o isco) : Mas nem sequer vem referido o nome durante o filme…

Edgar Pêra: Vem na ficha técnica. E até que me estás a dar uma ideia…

CINE-TUGA: Lá vais tu a atrasar o filme...

Edgar Pêra ( sorriso inocente) Eu?

CINE-TUGA: Sim!

Edgar Pêra: Não tens vergonha de não saber que era o José Régio? Já o Sargento Bera dizia que “o que interessa é a cultura geral” e que “todos os assuntos se relacionam…”

CINE-TUGA: Lá estás tu a desviar o assunto.

Edgar Pêra ( sorriso inocente) Eu?

CINE-TUGA: Sim!

A conversa entra em loop, a luz ainda se turva mais e mais…a voz do narrador enche a sala.
“E o rio turvo crescia. Crescia sempre….”

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